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O que aconteceu com o trigos ancestrais?

Uma viagem dos Trigos Ancestrais à revolução genética


Trigos Ancestrais

Muito antes do trigo moderno dominar os campos e as padarias do mundo, o cereal que sustentava as civilizações era outro: puro e natural. Estamos falando do Einkorn (Triticum monococcum), o primeiro trigo domesticado pela humanidade, com apenas 14 cromossomos, um código genético simples, o mais puro de todos, fácil de digerir e nutritivo.


Esse trigo era tão essencial à alimentação dos povos antigos que fazia parte da dieta de Ötzi, o Homem do Gelo do Tirol. Com o tempo, o Einkorn deu origem ao trigo Emmer (Triticum dicoccum), resultado de um cruzamento natural com uma gramínea silvestre. O Emmer se espalhou pelo Oriente Médio e Europa, sendo cultivado por milênios. É muito provável que ele seja o “kussemet” citado na Bíblia, o trigo que alimentava o povo hebreu durante a travessia do deserto.


Mais adiante surgiu a Espelta (Triticum spelta), um trigo ancestral muito popular na Europa durante a Idade Média. Mesmo tendo surgido a partir de cruzamentos naturais entre o trigo Emmer e gramíneas silvestres, a Espelta manteve sua estrutura genética original, com 42 cromossomos, sem sofrer modificações modernas. É um trigo hexaploide, mas ainda assim puro. Sua digestibilidade é melhor do que a do trigo moderno, e ele é considerado um dos trigos antigos mais versáteis para a panificação. O Khorasan (Triticum turgidum subsp. turanicum), também conhecido como Kamut, é outro destaque dessa linhagem ancestral. Com sabor adocicado, alto teor de proteínas e boa digestibilidade, é um trigo naturalmente tetraploide, com 28 cromossomos, que nunca foi geneticamente modificado. Provavelmente originário da antiga Mesopotâmia, existem relatos de que seus grãos foram encontrados em tumbas egípcias. Na região da Anatólia, agricultores se referem a ele como “Dente de Camelo”, por causa do seu formato alongado, ou ainda como “Trigo do Profeta”, evocando uma lenda antiga de que Noé teria levado o grão consigo na arca.  Outro trigo menos conhecido, mas extremamente valioso, é o trigo Barbela. Uma variedade muito comum em Portugal, que foi amplamente cultivada até o início do século XX. Embora compartilhe o mesmo nome científico do trigo moderno (Triticum aestivum), o Barbela representa uma linhagem preservada, com glúten mais leve.


Até meados do século XX, a maioria dos trigos cultivados no mundo ainda era composta por essas linhagens antigas ou por suas variantes diretas. Eram sementes vivas, puras, com sabores autênticos e propriedades nutricionais que os nossos corpos reconhecem há milênios. Essas sementes estavam sob o cuidado dos próprios agricultores, que as selecionavam e trocavam de acordo com as necessidades do solo, do clima e da cultura local.


A ruptura começou com a chamada Revolução Verde, nas décadas de 1940 e 1950. A proposta era nobre: aumentar a produtividade agrícola para combater a fome mundial. Liderada pelo agrônomo americano Norman Borlaug, a Revolução Verde promoveu o cruzamento de milhares de variedades de trigo utilizando técnicas de retrocruzamento, mutagênese química com substâncias como a azida de sódio, e até a exposição das sementes a radiações ionizantes. Assim surgiram os trigos “semi-anões”, de menor estatura, ciclo curto e altíssimo rendimento por hectare. No entanto, esses novos trigos passaram a depender fortemente de fertilizantes sintéticos, pesticidas e sistemas de irrigação controlada. Foram adaptados para a agricultura intensiva, mecanizada, e perderam o vínculo com os alimentos ancestrais.


Estudos mostram que esses trigos modernos, como o Clearfield®, expressam ao menos 14 novas proteínas do glúten que não existiam nas plantas originais. Essas proteínas têm sido associadas ao aumento de intolerâncias, doenças autoimunes e à doença celíaca. Além disso, o foco na produtividade acabou comprometendo a qualidade nutricional. Muitos nutrientes presentes nos trigos ancestrais foram reduzidos ou perdidos, gerando alimentos mais pobres e, muitas vezes, mais inflamatórios.


Ao mesmo tempo em que o trigo passava por essa transformação genética, algo silencioso e igualmente impactante acontecia: a transferência do controle das sementes. Até a primeira metade do século XX, elas estavam nas mãos dos agricultores. Nas décadas seguintes, esse controle foi gradualmente retirado deles e passou para grandes empresas multinacionais. Sementes que antes podiam ser guardadas, replantadas e compartilhadas passaram a ser híbridas, muitas vezes estéreis, exigindo compra constante e registro oficial para cultivo. A produção agrícola ficou refém de pacotes tecnológicos que envolvem sementes patenteadas, insumos químicos e contratos com cláusulas restritivas.


Esse modelo não só reduziu a diversidade genética como também ameaçou a soberania alimentar de inúmeras comunidades. Políticas públicas e incentivos que deveriam fortalecer os pequenos produtores muitas vezes acabaram os empurrando para regimes de dependência e exclusão. Ainda assim, em meio à uniformização e ao avanço da agricultura industrial, algumas linhagens ancestrais de trigo resistiram. Continuam sendo cultivadas por pequenos agricultores que preservam métodos tradicionais, mantêm a biodiversidade e respeitam o ritmo da terra.


Hoje, mais de 99% do trigo cultivado no mundo vem dessas linhagens modernas: mais produtivas, mas também mais empobrecidas. Por isso, resgatar os trigos antigos, Einkorn, Emmer, Espelta, Khorasan, Barbela; é mais do que um retorno às origens. É uma escolha consciente, que valoriza a saúde, o sabor e a conexão com a terra.


Na Cora, acreditamos que a revolução do trigo começa com a memória. Porque, como diz a sabedoria antiga: “do bom grão, nasce o bom pão”. E quando voltamos ao que é essencial, descobrimos que o futuro da alimentação está exatamente onde tudo começou.

3 comentarios


Depois que li Barriga de Trigo comecei a comprar o Einkorn, mas ainda não conhecia esses outros trigos descritos no artigo. Tomara que mais produtores se interessem por trigos ancestrais.

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Excelente post!

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Muito esclarecedor!!! 👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼

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